Uma sensação cada vez mais comum é a da instabilidade.
Sentimos cada vez mais que nada é permanente. Que o mundo pode mudar de rumo a qualquer instante, e todos os referenciais que tínhamos deixam de existir.
Isso é mais forte quando acontece uma grande catástrofe, como a de Nova York, ou quando alguma economia importante no mundo passa por dificuldades graves, influindo nas demais, como o caso da Argentina.
No entanto, se pararmos para observar nossa vida com mais cuidado, encontraremos uma grande soma de pequenos eventos que também provocam mudanças, não tão profundas, mas rápidas e impiedosas.
Mudamos de trabalho, de endereço, de telefone, de provedor, de amigos, de estado civil, de idéias, de opiniões, de certezas. E, no entanto continuamos os mesmos. Não será uma contradição?
E o mais espantoso é que as mudanças em nossas vidas, no ambiente em que vivemos e no mundo parecem cada vez mais velozes, e de fato são. A única coisa que não muda atualmente é a tendência à mudança.
Há mais de vinte e cinco séculos viveu, na cidade de Éfaso, na costa da Grécia, um filósofo chamado Heráclito. Apesar de ter vivido em uma época em que os fatos não se sucediam com a rapidez de hoje, ele teve duas percepções importantes a respeito desse tema, e, por isso, tem sido cada vez mais citado, como alguém que realmente tinha razão.
A primeira idéia de Heráclito foi a da unidade dos opostos. Segundo ele absolutamente tudo na vida é composto por fenômenos, valores ou tendências totalmente opostas, mas que se complementam.
Uma estrada tem uma subida e uma descida. E continua sendo uma estrada só, e não duas. Se alguém diz que o copo de água está meio vazio, enquanto outro afirma que o copo está meio cheio, estão falando sobre o mesmo copo, e não sobre dois. É o mesmo, mas há opiniões opostas a seu respeito. Essas opiniões não são contraditórias, mas complementares, pois o copo está, na verdade, meio cheio e meio vazio.
O que Heráclito queria dizer com isso é que as contradições são naturais e nem sequer devemos lutar contra elas, e sim aceitá-las. Quando tratamos de eliminar a contradição estamos, em verdade, tentando eliminar a própria realidade.
O que percebemos disso, é que a realidade é, portanto, totalmente instável, pois nela habitam os opostos.
Nada, disso deduzimos, é permanente. Tudo está mudando o tempo todo.
Daí nasce a segunda observação de Heráclito: “tudo flui”.
Segundo ele, você “não pode banhar-se duas vezes no mesmo rio”, pois, na segunda vez, ele já não será o mesmo, uma vez que aquela água já se foi, e esta é outra.
Heráclito estava certo. Temos que estar preparados para conviver com os opostos e para adaptarmo-nos a novas realidades.
Algumas pessoas têm incrível dificuldade para lidar com essas duas situações, e pagam um preço alto por causa disso. O correto é exercitarmos, permanentemente, nossa capacidade de percepção, que é a primeira das virtudes. A percepção permite a compreensão e a adaptação.
Compreender o valor da opinião contrária, e aprender com ela. Aceitar a ambigüidade do mundo, e decidir pela alternativa que parece ser a mais certa para aquele momento. Porque em outro momento a opinião pode mudar. A não aceitação dessa realidade provoca paralisação.
Há uma diferença entre “dualidade” e “impasse”. Os opostos de Heráclito compõem dualidade. Dia e noite. Vida e morte. Homem e mulher. Inverno e verão. A dualidade pressupõe o uso do “e”. O impasse vale-se do “ou”. Viveremos tão melhor quanto mais aceitarmos o “e”, que pressupõe acréscimo, não divisão.
E aí veremos que “tudo flui” na direção certa. E como diz aquela música que tanto ouvimos e apreciamos: “nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia, tudo passa, tudo sempre passará...”.
Por Eugenio Mussak
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Há 14 anos
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